Amanhã! — é o sol que desponta, É a aurora de róseo fulgor, É a pomba que passa e que estampa Leve sombra de um lago na flor. Amanhã! — é a folha orvalhada, É a rola a carpir-se de dor, É da brisa o suspiro, — é das aves Ledo canto, — é da fonte — o frescor. Amanhã! — são acasos da sorte; O queixume, o prazer, o amor, O triunfo que a vida nos doura, Ou a morte de baço palor. Amanhã! — é o vento que ruge, A procela d'horrendo fragor, É a vida no peito mirrada, Mal soltando um alento de dor.
Amanhã! — é a folha pendida. É a fonte sem meigo frescor, São as aves sem canto, são bosques Já sem folhas, e o sol sem calor. Amanhã! — são acasos da sorte! É a vida no seu amargor, Amanhã! — o triunfo, ou a morte; Amanhã! — o prazer, ou a dor! Amanhã! — o que val', se hoje existes! Folga e ri de prazer e de amor; Hoje o dia nos cabe e nos toca, De amanhã Deus somente é Senhor!
Gonçalves Dias